Violeiros são como os antigos bardos. Têm os mesmo sonhos embora usem, civilizadamente, colarinho e gravata e andem calçados. E embora também o seu meio de locomoção não seja mais o caminhar sem fim pelas estradas poeirentas, mas as ferrovias da Companhia Paulista. Exibem-se aqui e ali, isto é, — exibem-se não é bem o termo — procuram um contato com o público. Sua arte primitiva também precisa de divulgação e compreensão como todas as artes. Esses troveiros — como os menestréis, os cantores da gesta e os sentimentais seresteiros — cantam para alguém. É uma necessidade o seu cantar, chorando mágoas em rimas tocantes e contando casos nas modas dolentes.
O Centro de Folclore de Piracicaba promoveu o espetáculo no antigo e tradicional teatrinho de Santo Estevão. Primeiro são apresentadas as modas de viola, e que incrível impressão de viagem no tempo para mil oitocentos e qualquer coisa, quando se ouve o repinicado e as modas, e com a entrada dos cantadores. Vêm dois a dois: um violeiro, que é também cantador, e o segundo que faz o contracanto.
Entram, e eles mesmos não sabem como, e a gente fica com o coração nas mãos de medo que errem, que façam fiasco, que se vão embora sem dizer nada, ou que fiquem ali parados, com aquela desoladora expressão de quem não sabe onde está. Mas o que acontece depois é magnífico. Durante o canto, adquirem aprumo. Isolam-se. Parecem fora do palco e do mundo — ou fora ou acima — porém, de qualquer modo, absolutamente inconscientes da assistência. Constroem um estranho mundo para eles. Um mundo trágico, às vezes, quase sempre triste, onde há lágrimas e dramas, amores sucedidos, facadas, fugas, tudo aquilo vindo devagarinho, monotonamente, poema dolorista sem variações. Os rostos inexpressivos dos troveiros, quase todos mestiços, com traços reveladores do desordenado caldeamento de raças, vão se animando. Mostram-se ora místicos, ora piedosos, ora exaltados.
Violeiros
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